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Geração de lixo tecnológico aumenta a passos largos no Brasil

O CDI atua com o recebimento de equipamentos de informática para recondicionamento e, em seguida, os encaminha para ações nas comunidades que realizam cursos de informática e cidadania. Assim, ocorre a ampliação de oportunidades de geração de renda, educação e participação comunitária. As ONGs em que o CDI tem uma parceria estabelecida já desenvolvem atividades de capacitação de manutenção de computadores, e necessitam de mobilização para que a comunidade se envolva e participe ativamente dessas atividades, incorporando novas propostas.

Cada brasileiro - dos cerca de 204 milhões de habitantes - produz 7 kg de lixo eletrônico, segundo relatório das Organizações das Nações Unidas (ONU), divulgado no final do ano passado. São milhões de aparelhos celulares, tablets, TVs, mini-system, câmeras digitais, entre tantos outros tipos de eletroeletrônicos descartados ao ano.

E esses números só tendem a crescer, já que, além do aumento da população, existe outro fator que estimula a produção de mais resíduos: a vida útil dos produtos, que está cada vez mais curta. O mesmo relatório da ONU aponta que, no ano 2000, foram 10 milhões de toneladas de lixo eletrônico gerados por brasileiros. Hoje já são 50 milhões. Ou seja, cinco vezes mais em apenas 14 anos.

O diretor-presidente da Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos, Diógenes Del Bel, prevê um cenário ainda pior, caso o governo não tome as medidas necessárias com mais agilidade. "Desde 2010 esperamos pela implantação da Política Nacional de Resíduos, o que até agora não ocorreu. Inclusive, a Agenda Ambiental está atrasada. Enquanto isso, a fauna e a flora estão em risco de conta minação por metais pesados.", avalia Del Bel que explica: "Estamos falando de lixo eletrônico, porque o tecnológico engloba outros materiais, como os farmacêuticos, por exemplo, o que é ainda mais complexo".

No documento elaborado para a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), do Ministério do Meio Ambiente, a definição de resíduos sólidos é "material, substância, objeto ou bem descartado pelo homem, cuja destinação final ocorre nos estados sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d39água, ou exijam para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis devido à necessidade de tecnologia disponível". Há também os rejeitos: "resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentam outra possibilidade que não seja a disposição final ambientalmente adequada".

Dessa forma, consideram-se os produtos como computadores usados, telefones etc, como resíduos eletroeletrônicos, porque podem ser reciclados ou reutilizados, e não como lixo ou rejeitos. Conforme a gerente de Resíduos Perigosos do Ministério do Meio Ambiente, Sabrina Gimenes de Andrade, essa definição tem a ver com a destinação. "Por ser considerado rejeito, os produtos devem ser descartados separadamente do lixo comum, para que possam receber a correta destinação adequada, seja reciclagem, reutilização ou recuperação", afirma ela.

Descarte
Quando o descarte de resíduos é feito de forma adequada, os impactos ao meio ambiente são minimizados, assim como os danos causados aos homens. A reciclagem desses refugos sólidos gera renda para os grupos interessados em atuar no segmento, diminui os insumos e matérias primas para a produção de novos produtos e impacta positivamente no cuidado com o meio ambiente.

É por isso que, atualmente, algumas empresas geradoras desses resíduos já implementaram ações de reciclagem e reutilização dos refugos. A HP, por exemplo, tem programa de coleta e reciclagem para todos os produtos comercializados no Brasil. Para destinar um produto de maneira adequada, o cidadão pode acessar o site da HP (www.hp.com.br/reciclar) ou solicitar gratuitamente através do email: reciclagem@hp.com.

"O tema sustentabilidade é prioritário para a HP e está inserido na estratégia de negócios e em toda a cadeia produtiva da empresa. No Brasil, temos o 1º Centro de Reciclagem de Cartuchos da América Latina, localizado em Sorocaba - São Paulo", disse Kami Saidi, diretor de sustentabilidade da HP do Brasil.

Segundo ele, de 1987 a 2012, a HP já coletou, no Brasil, mais de meio milhão de toneladas de hardware e suprimentos de impressão. Saidi ressalta que os produtos HP que retornam ao final de sua vida útil, como computadores, impressoras e suprimentos de impressão, por exemplo, geram, entre outros, materiais como plástico e metal, os quais passam por processos de manufatura reversa e todos os itens são reaproveitados na cadeia produtiva da HP ou de outras indústrias.

Somente no ano de 2014 a empresa reciclou mais de 920 mil unidades de produtos, considerando tanto hardware e suprimentos de impressão, totalizando mais de 970 toneladas recicladas.

Já na IBM, uma empresa que já tem um modelo de negócios definido nesse segmento, por meio do Banco IBM, são recolhidos PCs, servidores, impressoras, tablets e smartphones. No caso extremo de descarte, além do vidro, todas as commodities que possuem valor de mercado são encaminhadas para a própria indústria para serem reprocessadas e reaproveitadas. Entre elas, a sucata de material ferroso, material não ferroso, plástico, alumínio e cobre. Desse total, 99% das peças terão algum reaproveitamento.

"Os números consolidados até 2013 indicam que o peso médio dos produtos, peças e materiais processados por semana, foi de 590 toneladas, considerando todos os países em que a IBM atua", conta Felippe Melo, diretor do Banco IBM. O banco, por sua vez, investe na manufatura e na venda de máquinas - de qualquer marca - que retornam ao inventário da IBM, por meio de três modelos: a volta de produtos ao término dos contratos de leasing operacional as máquinas usadas por clientes em projetos de outsourcing da IBM e a recompra de equipamentos dos clientes que estão adquirindo tecnologias mais atuais.

Conforme Melo, o benefício da área de Remarketing se inicia no momento em que o cliente resolve adquirir um equipamento na modalidade de um leasing a valor de mercado (FMV Leasing). O Banco IBM estima o valor do equipamento ao término do contrato e retira essa cifra das prestações. O cliente só paga este residual, caso decida ficar com o produto ao final do contrato.

"Os equipamentos retornados desta modalidade são recebidos e submetidos aos mesmos testes e triagens de uma máquina nova. A partir dessa avaliação, o equipamento pode ser recondicionado e revendido ter suas peças vendidas para empresas de manutenção, no caso da remanufatura não compensar financeiramente ou, como última opção, ser destinado à reciclagem ou descarte, via parceiros. Em média, 90% são revendidos".

Economia e geração de novos negócios
Uma das grandes vantagens da reciclagem para o empresariado é a economia nas despesas e, melhor, a possibilidade de novos negócios a partir dos insumos, embora as iniciativas ainda sejam incipientes e pontuais. Apenas grandes empresas, no Brasil, atuam diretamente na transformação desses insumos. A empresa de telecomunicações Oi, por exemplo, reutiliza materiais de escritórios, assim como os próprios equipamentos. Dados de 2013 apontam que, em três anos, Oi faz uso de envelopes reutilizáveis para correspondências internas. O layout desses envelopes tem espaço para diversos remetentes e destinatários, o que permite usá-los 12 vezes antes do descarte, reduzindo os custos com impressão de etiquetas e a quantidade de papel utilizado.

Entre as economias alcançadas por melhoria nos materiais para relacionamento com clientes, destacam-se a redução da quantidade de páginas e a troca do tipo de papel do Welcome Book (folheteria), além da redução do tamanho e troca do tipo de material da embalagem do sim-card (de plástico PVC rígido para BOPP).

Segundo informa a empresa, a Oi também foi pioneira no Brasil ao implementar um sim-card Duplo Corte (dois chips em um) visando diminuir os SKUs (Stocking Keeping Unit - Unidade de Manutenção de Estoque) e, consequentemente, a quantidade de diferentes plásticos produzidos. A recuperação de decoders, após o encerramento de contratos com os clientes, também minimiza o uso de materiais, pela reutilização destes por fornecedor especializado.

Só em 2013, foram recuperados cerca de 140 mil decoders. Somados aos 80 mil recuperados no ano anterior, essa iniciativa já levou à economia da ordem de R$ 37,4 milhões. No mesmo ano, foram geradas 634 mil toneladas de resíduos, designados a empresas certificadas para promoverem a correta destinação, o descarte ou o reaproveitamento dos materiais.

Assim, foram destinadas à reciclagem 5,4 mil toneladas de sucata, entre materiais de cobre, alumínio e ferro, cabos de fibra ótica, baterias, cabos telefônicos, sucatas de informática, fibra de vidro, partes de peças de telefones públicos e sucatas de mobiliário.

Com o propósito de reduzir os impactos ambientais decorrentes da sua operação, a Oi realiza o gerenciamento do material descartado (sucata), junto aos seus prestadores de serviços e efetua a venda a empresas de reciclagem homologadas pelos órgãos ambientais. Em 2012, foram vendidas 4.234,48 toneladas de sucata para reciclagem, formada por materiais de cobre, alumínio e ferro, cabos de fibra ótica, baterias, cabos telefônicos, sucatas de informática, fibra de vidro, partes de peças de telefones públicos vandalizados, sucatas de mobiliário, entre outros. Todos esses materiais oram encaminhados para reciclagem.

Projetos sociais
Outro benefício que nasce do lixo são os projetos sociais. A Oi, passou a patrocinar, em 2013, na Bahia, o Comitê para Democratização da Informática (CDI-BA) e o Oi Futuro, instituto de responsabilidade social da Oi, por meio do programa Oi Novos Brasis, e também o projeto "Lixo Tecnológico para Transformação Social". Com isso, a empresa beneficia cerca de 500 pessoas de comunidades carentes do Estado.

O banco CAIXA também percebeu a importância e oportunidades que são criadas a partir dos insumos. Dessa forma, criou o Projeto Lixo Eletroeletrônico e Responsabilidade Socioambiental, em uma parceria com o Instituto GEA - Ética e Meio Ambiente, em junho de 2013.

Em operação nas cidades de Brasília, Salvador, São Paulo e Recife, o projeto tem por objetivo promover a capacitação de catadores estruturados em cooperativas e instrumentalizá-los com ferramentas para desmontagem e venda de resíduos eletroeletrônicos doados pela CAIXA.

A partir daí, as cidades atendidas pelo projeto também recebem instalação de caixas coletoras onde a população pode descartar seu resíduo eletrônico. São ao todo 45 caixas coletoras para descarte de equipamentos eletrônicos de uso pessoal. (Veja a lista de endereços em http:// www.institutogea.org.br/lixo-eletroeletronico/pontos-de-coleta/ )

De acordo com informações da assessoria de imprensa do banco, o tipo de resíduo, quando separado de forma correta, eleva o seu valor de venda em até dez vezes, o que representa uma oportunidade de aumento de renda para as cooperativas. A estimativa do banco é a de que o projeto irá beneficiar diretamente 220 famílias, proporcionando uma forma sustentável de geração de renda, pois alguns dos componentes de resíduos eletroeletrônicos processados adequadamente possuem valor de mercado até dez vezes maior que o resíduo não processado.

A iniciativa busca também reduzir o risco de contaminação do meio ambiente por resíduos tóxicos encontrados nos equipamentos. O investimento do Fundo Socioambiental foi de R$ 1 milhão no projeto de reciclagem de eletroeletrônicos. Contudo, ao retirar de seus depósitos materiais inservíveis, é possível reduzir gastos com estocagem de material, cujo custo do m2, nos grandes centros urbanos, é elevado.

Em 2014 foram economizados em torno de R$ 60 mil com a retirada de materiais inservíveis de depósitos. As cooperativas coletaram 13.970 peças, o que lhes rendeu um valor adicional de R$ 136.948,80, considerando as doações feitas pela CAIXA e o material coletado junto a outros órgãos, empresas e comunidade que agora podem fazer uso de caixas coletoras instaladas em vários pontos onde o projeto está instalado.

Políticas Públicas
Embora a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), do Ministério do Meio Ambiente ainda não tenha sido implementada como esperado, a gerente de Resíduos Perigosos do Ministério, Sabrina Gimenes de Andrade, observa que existem boas oportunidades relacionadas ao mercado de reciclagem, apesar de que a reutilização e reciclagem dos insumos ainda seja incipiente entre as empresas privadas e públicas do País.

"Atualmente existem poucas plantas no mundo com capacidade para recuperar os metais preciosos como prata e as terras raras como lítio, que fazem parte dos eletroeletrônicos e não são aproveitadas", diz Andrade.

Em relação às políticas, ela afirma que o MMA está trabalhando na construção do sistema de logística reversa. Conforme a gerente, por meio da discussão de acordo setorial com fabricantes, importadores e comerciantes, para estabelecer uma forma de operacionalização, metas e responsabilidades para esse sistema. "Já foi publicado o edital de chamamento para que o setor apresentasse propostas de acordo. Foram recebidas 10 propostas, das quais quatro foram habilitadas e começaram a discussão para que houvesse adequação das propostas ao edital de chamamento e à legislação vigente".

Dessa forma, o que se percebe é que o momento é de negociação entre MMA e o setor empresarial. "O próximo passo será a publicação desse acordo em consulta pública. Além disso, existem iniciativas de incentivos à reciclagem por outros órgãos do governo, como o BNDES.", ressalta.
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